sábado, 9 de junho de 2012

O MENINO SOTERRADO


 
Eram nove meninos soterrados, seis irmãos e três primos.
Mas um tinha se salvado.
Tinha aguentado a casa em cima,
a casa que desbarrancou e foi levada de roldão
e era só lama e pedras e escombros.
E os nove meninos por baixo.

Mas o Felipe foi achado e estava vivo,
o Felipe tinha estofa de herói.
Depois de mais quatro horas embaixo daquela avalanche,
o Felipe foi tirado com vida.

O que não teria acontecido lá embaixo da terra?
O desespero daqueles meninos.
A lama da morte entrando goela a dentro.
O Felipe assistindo.
Os irmãos morrendo devagar, os primos morrendo
muito devagarinho,
com toda a dor que a bruxa vagarosa da morte sabe dar.
E o Felipe assistindo.
Esperando a sua vez.

O Felipe era um herói.
E não morreu.
Os heróis não morrem nunca.
Os milagres, para os heróis, sempre acontecem.
O Felipe assistiu, uma a uma, à morte dos irmãos, dos primos.
O mundo desabou,
ele sustentou com a sua cabecinha frágil os escombros do mundo.

Mas foi muito peso para a sua cabecinha frágil.
Toda a dor do mundo, a morte daqueles menininhos.
Toda aquela dor na sua cabecinha de nada.
Era uma cabecinha muito frágil.
A dor da morte, o peso dos escombros.
Partiu-se a cabecinha,
o seu pequenino crânio se trincou,
se quebrou como um vaso que cai.
Como um ovo jogado no chão,
a casca tão fina esmagada.

Foi operado.
Uma última tentativa.
Juntar os cacos.
Como se fosse possível juntar os cacos de um vaso quebrado.
Como se fosse possível colar a casca esmagada de um ovo.
Inútil.
Saíra como um herói, ostentando o estandarte da vitória.
Um rei coroado.
Felipe é nome de rei.
O cavalo de Felipe relincha cavalgando livre pelas pradarias do seu
       [reino.
                    



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